sexta-feira, 27 de março de 2009

«Crónica-História» - "História da nossa terra!"

O “rego de água” da vila de Moimenta e as disputas entre as freiras e a elite local

Bem essencial, a água suscitou vida e morte no decurso da história da humanidade. O seu consumo pelas massas associado à alimentação tal como é encarado actualmente é uma realidade recente. A história da alimentação mostra-nos que até há bem pouco tempo a água era a principal responsável pela propagação de toda uma série de doenças e pestes, sendo portanto o vinho, o líquido ingerido maioritariamente por todos os estratos e faixas etárias da população.
Não foi, porém, com o objectivo de consumo alimentar que o rego de água que atravessava a vila de Moimenta suscitou duros confrontos entre as freiras do convento de N. Sra. da Purificação e a gente grada da terra. Entre o vasto espólio documental que deste mosteiro foi conservado, encontrei interessantes menções a este conflito setecentista. Sabe-se que o povo e a Câmara de Moimenta da Beira haviam consentido que as freiras fruíssem do rego público que corria pela vila e passava pelo convento, duas vezes por semana, uma vez que, as religiosas, sendo de clausura, não podiam transpor os muros conventuais. Ao que tudo indica, a elite local apropriara-se deste curso de água in solidum com prejuízo para os direitos das freiras que diligentemente protestaram junto da justiça local e da Comarca de Lamego. Não surtindo efeito o protesto, pois nada dissuadia o poder e influência dos senhores de Moimenta, as freiras apelaram para o rei D. João V, fazendo-lhe saber que inclusivamente se achavam pobres, empenhadas e sem meios para resolverem problema. Foi então que este monarca, cônscio dos graves prejuízos e injustiças de que padeciam as religiosas de Moimenta, mandou concertar uma provisão a 6 de Maio de 1738, dirigida ao corregedor da comarca de Lamego, através da qual provia as freiras de um dia de água por semana (segundas-feiras) para regar a cerca e se «lavarem as imundícies necessárias». Em 1739 este direito foi registado no livro da Câmara para que fosse aplicado. Por esta altura era abadessa D. Ana Eufrásia de Vasconcelos Leite; Brites da Fonseca era prioresa, D. Isabel de Vasconcelos, deputada; D. Joana Jacinta de Vasconcelos, deputada e D. Joana Sofia de Vasconcelos, escrivã.
A penúria apregoada pelas freiras era certamente consequência das obras conventuais realizadas no decurso dos séc.XVII e XVIII e do facto das rendas e foros terem sido usurpadas, situação que levou a abadessa D. Ana Isabel de Vasconcelos a solicitar ao rei a elaboração de um tombo de propriedades, o que veio por acontecer em 1768. A súplica mereceu atenção favorável de D. José que, por uma provisão de 5 de Setembro de 1768, indigitou para juiz do novo tombo Joaquim Ferreira Tavares. Em 8 de Novembro do mesmo ano os éditos foram afixados no PELOURINHO da vila, e escolhido para escrivão Feliciano António de Gouveia e Vasconcelos.

Autor:
Jaime Ricardo Gouveia

14 comentários:

Moimentense de Gema disse...

Boas...

Um artigo bastante interessante, sobre a história da nossa Vila.
Já ouvi falar num túnel que ia até ao Alto do Pombo.

Cumprimentos
JP

Moimentense disse...

Mais um grande post a juntar a tantos outros post's excelentes.

Parabéns ao Jaime.
Este tipo de crónicas, assim como as do José Carlos Santos são sem dúvida uma mais valia para o Blogue e para os Moimentenses em geral.

Parabéns.

Grande abraço

Jaime Gouveia disse...

Eu é que devo agradecer todo o incentivo que me têm dado... e dar os parabéns aos administradores do blogue por terem sensibilidade para estas coisas da cultura, lamentavelmente o parente pobre do nosso país.

Jaime Gouveia disse...

Um túnel até ao alto pombo JP? Nunca ouvi falar... mas isso é muito interessante. A existência deste rego de água que no artigo esqueci de mencionar que vinha de de Caria, pode muito bem mostrar que outros existiam, ou que ele passava inclusivamente no Alto do Pombo.
Abraço.

Direcção IAC disse...

Muito bom dia, muito bom este artigo do meu amigo Jaime Ricardo, um poço de sapiência da cultura histórica da nossa região.
Apraz-me dizer que certamente haverá muito mais para explorar tanto a nível histórico, como a nível cultural da nossa região.
A muita coisa que deve ser transmitida e agregada ao povo das terras do demo.
Porque o nosso pendor e a cultura, e nossa imagem e a história.
Um abraço e mais uma vez parabéns.
Ass- João Silva

Porque o nosso pendor e a cultura, e nossa imagem e a historia.
Um abraço e mais uma vez parabens.
Ass- João Silva

Moimentense de Gema disse...

Boas...

Acho q estou a fazer confusão com um túnel através do qual as freiras se deslocavam à missa no Convento de S. Francisco.

Cumprmentos
João Pedro

Hugo Santos disse...

Grande Artigo.

Parabéns ao Jaime pelo post.

Abraço

Jaime Gouveia disse...

Obrigado ao João Silva e ao Hugo.
João Pedro - pois... desse túnel fala-se de facto... seria excelente encontrá-lo mas creio que isso é ficção. Seria uma imitação do Vaticano que também tem um túnel bem cumprido para o Castelo de Santo Ângelo... mas em Moimenta as freiras lá tinham que ficar enclausuradas pela cerca do mosteiro e aproveitar bem na festa de S. João, um dos raros momentos de folia que tinham no ano... onde se cometiam muitos excessos. Irei, quando puder, escrever um artigo sobre isso.

Hugo Santos disse...

Boa Noite,

Pelo que ouço, o "tal" túnel existe mesmo porque já houve quem tenha dito que entrou lá mas que a partir de uma certa parte o túnel já "desabou".
Pelo menos é o que dizem.

Abraço

Jaime Gouveia disse...

Hugo... tenho que investigar sobre isso... A ser verdade era... simplesmente fantástico!!! Por acaso fazes a mínima ideia de quem é que diz já lá entrou? É que aquilo é privado e está fechado há anos!

João PM Dias disse...

Bom tarde,

Por acaso, é mais ou menos essa história que sempre ouvi falar, mas não sei se será verdade.
Quem sabe dessas histórias são as pessoas mais velhas daqueles lados do terreiro e das 5 ruas.


abraço,
joaomd

Hugo Santos disse...

Vou tentar saber se há pessoas que tenham entrado e se possível falo com elas. Assim que tiver novidades aviso.

Quanto ao túnel, até já ouvi mais coisas. Desde miúdo que ouço dizer (esta não tenho a certeza quem me contou mas penso que foi um professor que tive a História) que na altura das invasões francesas todo o ouro (ou outro tipo de peças preciosas) da "vila" foi roubado excepto o do Convento das Freiras que foi escondido no tal túnel e nem os franceses o descobriram. Se é verdade ou não...

Abraço

Jaime Gouveia disse...

Porreiro! Se souberem de novidades avisem. O grande problema destas coisas é o facto de serem privadas e por vezes não termos acesso a elas. Mas isso faz todo o sentido... porque na realidade a capela de S. Plácido foi completamente pilhada e destruída, o mesmo acontecendo com a casa dos viscondes... e na realidade parece que o convento se manteve intacto, até no que diz respeito "ao tal ouro".
Abraços

José Carlos Santos disse...

Em relação ao túnel de que se fala, também já ouvi dizer aos mais velhos que existe uma passagem da Fonte da Pipa ao altar do Convento. E acrescentam também que debaixo do Terreiro existe um enorme salão subterrâneo e uma mesa ao centro. Sendo verdade ou não, ficamos sempre curiosos.