domingo, 26 de abril de 2009

«Crónica-História» - "História da nossa terra!"

Comissão Nacional de Censura inviabiliza em 1968 o Jornal “O Malhadinhas”

Comemoram-se, no dia 25 de Abril, 35 anos do termo do regime ditatorial “Estado Novo”, iniciado em 1933 e findo com o golpe militar de 1974. A história do 25 de Abril e do regime a que pôs cobro encontra-se ainda muito politizada e mal reconstituída. Para os filhos da liberdade, como eu, torna-se difícil entender na sua plenitude uma realidade não vivida. Para aqueles que são testemunhos vivos desse tempo é difícil olhar para trás sem paixões, nostalgias, ou ódios. A melhor forma de lançar um olhar isento sobre este passado recente é analisar os factos históricos, o que se fará com a história que se segue, para a qual utilizo os arquivos da PIDE que há dias consultei na Torre do Tombo.
Em 10 de Maio de 1968, no decurso do aludido regime ditatorial, o então pároco de Moimenta da Beira e professor no Externato Infante D. Henrique, A. Bento da Guia, decidiu fundar um Jornal local, ao qual atribuiu o nome de “O Malhadinhas”. Dirigiu-se então por carta ao Director dos Serviços de Censura e solicitou permissão para a publicação do referido quinzenário, que deveria sair ao público nos dias 1 e 15 de cada mês, com uma tiragem prevista entre os 500 e os 1500 exemplares, com redacção na rua Sidónio Pais, destinado à comarca de Moimenta da Beira.
A Comissão censória responde em 15 de Maio solicitando o preenchimento de dois boletins relativos ao proprietário do Jornal, o padre Bento, e ao director nomeado, António de Lemos Gomes, presidente da autarquia moimentense e do Externato local, os quais foram enviados em 18 de Maio. Pelo ofício 305 que levava escrito “confidencial”, dirigido ao Director da PIDE, em 21 de Maio de 1968, apresentavam-se as informações requeridas. O documento foi então carimbado pela PIDE com a data de 25 de Junho de 1968.
Por aqui morreria o processo se o padre Bento da Guia não se revelasse irreverente e persistente. Logo em 3 de Julho, por carta dirigida ao Director dos Serviços de Censura, o sacerdote moimentense lamentava não ter obtido resposta e mostra-se convicto de que se tinham levantado dúvidas quanto à orientação política do jornal, por isso assevera: Eu nunca tive nem terei qualquer actuação política; o meu objectivo é a valorização das pessoas e dos grupos sociais do meio onde trabalho segundo os valores tradicionais e indiscutidos da Pátria e da Igreja. Fundei e dirigi durante anos o quinzenário CORREIO BEIRÃO que dei à Corporação de Bombeiros local; dirijo há anos o boletim paroquial VOZ DE S. JOÃO e a revista-jornal CONTR’O VENTO da M.P.; publiquei já bastantes artigos em diversos jornais, e nunca levantei quaisquer problemas aos Serviços de Censura que nunca cortaram sequer uma linha do que escrevi. O jornal cuja publicação requeri não tem quaisquer pretensões políticas; visa apenas a informação e a cultura de um sector desta região; pretende fomentar a boa amizade e compreensão entre todas as pessoas e deseja obter fundos (dinheiro) para o FUNDO DE FOMENTO ESCOLAR destinado a bolsas de estudo para alunos do Externato de Moimenta. Este Externato suspendeu agora todas as bolsas de estudos que dava (e eram bastantes) e muitos alunos terão de suspender a sua carreira.
Perante esta explicação, a Comissão censória manteve-se inflexível: “informo V. Ex.ª de que o processo do jornal “O Malhadinhas”, que V. Ex.ª pretende publicar, está aguardando melhor oportunidade. A bem da Nação. Lisboa, 23 de Julho de 1968.” Não desistira, porém, o padre Bento. Em 23 de Setembro de 1969 escreve nova missiva, através da qual informa que em Moimenta da Beira se tinha deixado de se publicar o Jornal Correio Beirão e tinha já passado o hipotético perigo de que o jornal tomasse posição política, pois só poderia começar a publicar-se depois das eleições. A terminar, assevera ainda: “reafirmo a minha posição inicial: o jornal será de informação e cultura, sem qualquer política, a não ser o maior bem na Nação dentro da Constituição Política em vigor, e em colaboração com o Governo.”
Um programa televisivo, referindo-se a esse tempo, intitula-se “Conta-me como foi”. Foi assim, é a resposta! Creio que este Esparso o traduz bem. No fim, apetece dizer duas coisas: Bem-haja ao padre Bento, e parabéns à Moimenta dos beirões de gema, para quem vale mais quebrar que torcer!!!

Autor: Jaime Ricardo Gouveia

1 comentário:

fernanda disse...

Sou do brasil e queria ter noticias de parentes, minha bisavó é Maria Fonseca Rebelo. Obrigada
Fernanda Reis