quarta-feira, 15 de setembro de 2010

António Maria Augusto Pereira de Sèves de Oliveira

O Dr. António Maria Augusto Pereira de Sèves de Oliveira nasceu a 8 de Abril de 1860, em Leomil, numa residência com vista para o largo arborizado, sala de visitas de Leomil, que hoje, em sua homenagem, tem o seu próprio nome. Era filho de Francisco Pereira de Sèves de Oliveira e de D. Isabel Maria de Sèves de Oliveira, proprietários da residência acima referida. Faleceu em 6 de Dezembro de 1930. Casou com D. Adelaide de Sèves de Oliveira que faleceu em 27 de Novembro de 1924.

As suas origens entroncam num ramo familiar fidalgo, de Salzedas, que veio a fixar-se em Leomil em virtude da vasta superfície de terras que aqui possuíam. Convém não esquecer que durante um bom pedaço da Época Moderna, o dízimo das propriedades fundiárias leomilenses era devido ao mosteiro de Salzedas. O corte de relações com os familiares dessa localidade, mercê das suas fortes personalidades, ditou o uso do apelido de origem francesa Sèves, em detrimento de outros. Porém, consta que os Sèves descendem de um oficial francês que viveu na região por ocasião das Guerras Peninsulares. Consta ainda que esse Sèves, ou seja, natural de Sèvres (França), terá morrido em combate às portas de Almeida. Um seu irmão que por aqui passou também, Octávio José de Sèves, viria a tornar-se pachá do Egipto. Falecido em Alexandria, em 1860, o seu prestígio perdurava na corte do Egipto quando lá chegou o diplomata Dr. António de Sèves filho do Dr. António Maria Augusto Pereira Sèves de Oliveira.

Fez em Leomil a sua instrução primária, seguindo para Coimbra onde tirou o curso do liceu, matriculando-se na Faculdade de Direito da Universidade sediada nessa cidade. Concluíu a formatura com brilhantismo, pelo que fora convidado, pelos mestres, a doutorar-se, o que não fez. Sentindo uma grande atracção para a magistratura, embrenhou-se nessa carreira, preterindo o doutoramento. Em Coimbra conheceu e casou com D. Adelaide Estevão de Sèves de Oliveira, filha de uma das mais importantes e ricas famílias ribatejanas.

Na Magistratura cunhou desde cedo a sua importância e valor. Desde logo como Delegado em várias comarcas, tendo sido promovido a juiz, pouco tempo depois. Enquanto juiz de Direito, continuou a semear frutos que haveriam de fazer florir a sua brilhante carreira, no continente, no Funchal e nos Açores. Não fora fácil para si, a aludida ascensão. Não se esqueça que nesta altura tinha ele inimigos ferozes. Era monárquico ferrenho, a quem os republicanos democráticos não deram tréguas.

A Ilha Graciosa, para onde embarcou em fins de 1913, vivia um período insustentável em matéria de justiça, em virtude do incumprimento de foros de dívida que ali ninguém queria pagar. A situação preocupava o Ministério da Justiça e o Governo, até que, o Dr. Germano Martins, antigo condiscípulo do Dr. Sèves e seu grande inimigo político, que desempenhava elevadas funções no Ministério da Justiça, informou o Ministro, de que conhecia um juiz, que ou era assassinado pelos já célebres homens do Sul, na Graciosa, ou, os metia na ordem de vez! Foi por isso que o Ministro decidiu para aí enviar o juiz de têmpera rija, na expectativa de ver o que sucedia. Sem medos, lá foi o Dr. Sèves a quem se juntou, logo de seguida, o Dr. Luís de Cabral Moncada, Delegado do Ministério Público, e mais tarde Lente de Direito em Coimbra. Um mês depois da sua chegada, o Dr. Sèves já tinha assombrado os homens do Sul, com vigorosa acção, paralisando-os de espanto. Sofre então o primeiro atentado à bomba, do qual sai, miraculosamente são e salvo. No dia seguinte a tão vil acção, desloca-se sozinho para o Sul da Ilha, percorrendo as principais povoações, entrando nas tabernas, apinhadas de gente, a comprar cigarros de que não necessitava! Volvidos poucos dias, entra no porto da Graciosa o vapor de S. Miguel, com destino a Lisboa. Os homens do Sul, aproveitando o momento, cercam-lhe a casa, ao romper do dia, onde se encontrava com toda a família, intimando-o a embarcar a bem ou a mal. Porém, nem a bem, nem a mal, embarcou! Comunicada a gravíssima situação ao Ministro, partiu de S. Miguel, numa lancha a vapor, um contingente militar que prontamente desembarca na Graciosa, para manter a ordem, o que acontece, de vez.

Em 1924 fica viúvo e regressa a Moimenta, onde vem a falecer em 6 de Dezembro de 1930. Durante esse período continuou a dedicar-se à Advocacia, onde manteve sempre um lugar de destaque. Deslocava-se a Leomil todas as semanas, não raro mais do que uma vez, e quando o não podia fazer, várias pessoas foram disso testemunha, ia ao alto de Moimenta e aí ficava longo tempo, absorto nos seus pensamentos, olhando com ternura para a sua terra que sempre amou.

Fidalgo austero, justo, profundamento bom, a todos falando com terna estima, deslocando por todos os caminhos de Leomil a nobreza do seu inconfundível porte e no sangue que corria nas veias que albergavam ainda os mais elevados sentimentos e onde apenas um não corria: o medo.

Os restos mortais respousam no cemitério de Leomil, por sua expressa vontade, num jazigo mandado contruir para ele, por seu filho, embaixador Dr. António de Sèves, jazigo que em tudo se ajusta, em sentido estético e espiritual, ao que foi sempre, essa personagem.

Cabe a António Ferreira Dias, que o conheceu pessoalmente, a mais brilhante biografia que deste homem alguma vez vi, publicada em 1973 no Jornal Beira Távora. Diz, logo no prólogo do seu pequeno texto, o seguinte: “Esse Homem foi sem sombra de dúvida, sob todos os aspectos, o mais ilustre filho de Leomil. O que mais devotadamente amou a sua terra e a sua gente. Por ela sacrificou tudo, defendendo com inquebrantável firmeza os seus legítimos interesses, dando-lhes bens, que outros queriam afincadamente partilhar, a favor de outras terras! Se Leomil tem a sua valiosa serra, se é esse valor, que ainda hoje pesa no orçamento da sua Junta de Freguesia, deve-o única e exclusivamente, a esse Homem, a esse seu mais ilustre filho! Na infatigável luta pela defesa dos bens da sua terra, vários e poderosos inimigos. Poderosos apenas, porque estavam acobertados por um anárquico regime político, que mandou indiscriminadamente no país durante umas décadas!”

Do seu currículo consta também a intervenção destacada na política local. Em 1890 foi presidente da Câmara Municipal de Moimenta da Beira e em 1906 foi administrador do mesmo concelho.

Publicado na última edição do Jornal Terras do Demo

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