terça-feira, 26 de abril de 2011

«Arqueologia» - O Convento Beneditino de Nossa Senhora da Purificação: Obra de Fernão Mergulhão

Tampa do túmulo de Fernão Mergulhão

O Convento Beneditino de Nossa Senhora da Purificação [1] é um dos mais notáveis monumentos do concelho de Moimenta da Beira, não só pela sua singularidade, como também pelo interessante enquadramento [2], cuja fundação deveu-se a Fernão Mergulhão [3], filho mais velho de Vasco Mergulhão (Fidalgo de Moimenta, Cavaleiro Professo da Ordem de Cristo e Moço da Câmara do Infante D. Fernando) e de Dª. Leonor de Lucena (filha de Fernão de Lucena, fidalgo espanhol estabelecido em Portugal durante o reinado de D. Afonso V, a quem ajudara na luta com Castela), residentes em Moimenta.

Numa análise muito breve, Fernão Mergulhão quis fundar este mosteiro de monjas (conseguindo-o por licença apostólica requerida ao Papa Clemente VIII, em 1594), nas casas [4] que o viram nascer, em favor de suas irmãs [5] (dedicadas à vida de clausura no Mosteiro de Semide) e por remédio de sua alma e de seus pais. Até 1812, ano em foi encerrado pelo Bispo de Lamego, D. João António Binet Pincio (em proveito do Convento das Chagas de Lamego), o seu mosteiro beneficiou de todos os privilégios de que usufruía a Congregação de São Martinho de Tibães, da Ordem de São Bento [6], crescendo, quer em número de religiosas, algumas das quais veneradas pelo povo como santas: Maria Osório, Filipa Pinto e Maria da Encarnação, cujo nome aparece na inscrição (datada de 1637) gravada ao lado do altar de São Francisco Xavier, quer em rendimentos, atingindo 590.000 Rs, 2.472 alqueires de centeio e 218 de trigo (como consta no livro Benedicta Lusitana de Frei Leão de São Tomás).

Pode dizer-se que a família dos Mergulhões (aqui bem representada por Fernão Mergulhão) teve, de facto, um papel preponderante na história de Moimenta da Beira, a partir do século XVI, ao construir a primeira casa brasonada [7] desta localidade (hoje, ainda, importante nos mais diversos aspectos) e, ao mesmo tempo, um dos poucos conventos femininos da Ordem de São Bento no país.

Quanto a Fernão Mergulhão, particularmente, resta dizer ainda que, para além da sua magnífica obra, teve um percurso brilhante e bastante proveitoso. Seguiu a carreira eclesiástica tal como o seu irmão. Estudou Jurisprudência na Universidade de Coimbra; foi Desembargador da Relação Primacial de Braga no tempo do Arcebispo D. Fr. Bartolomeu dos Mártires, Abade de São Clemente de Basto e ainda Governador do Arcebispado de Braga. Faleceu no dia 14 de Novembro de 1604 em Braga, sendo modestamente sepultado no chão (na zona central) da capela-mor do convento que fundou. Em oito linhas, ficou gravado, na tampa do seu túmulo (ver imagem), o seguinte: Aqui jaz o Doutor Fernão Mergulhão Fundador deste Mosteiro Ano 1604.

Medidas gerais da tampa (de contorno rectangular): 1,68m de comprimento x 1,13m de largura.
Medidas do campo epigráfico: 1,26m de altura x 0,70m de largura.
Altura máxima das letras: 0,10cm.


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[1]De traça maneirista, barroca e rococó. É composto pela igreja (decorada com azulejos seiscentistas de motivos geométricos, tendo como tons predominantes o azul e o amarelo), dois coros, duas sacristias (hoje, uma delas transformada em confessionário), dormitórios, refeitório, claustros, instalações diversas e uma pequena cerca.

[2]Lugar: Terreiro das Freiras, Moimenta da Beira.

[3]Fernão Mergulhão teve um irmão, Vasco Baptista (que se fez Jesuíta) e quatro irmãs: Dª. Maria Mergulhão (que casou com Dr. Lourenço Couraça Teixeira, difundindo o ramo da família dos Mergulhões de Moimenta); Dª. Isabel Mergulhão, Dª. Guiomar Nunes e Dª. Margarida de Lucena (que entraram como Beneditinas no Mosteiro de Semide, em Coimbra).

[4]Dadas aos seus pais pela Condessa de Marialva, Dª. Brites de Meneses, em 1533, por mercê e por um almude de “água rosada” cada ano.

[5]Em virtude de um Breve Papal datado de 1596, foram as primeiras monjas do convento de Moimenta, depois de transferidas, juntamente com outra religiosa chamada Antónia Foreira, do Convento Beneditino de Semide para o Convento Beneditino de Nossa Senhora da Purificação.

[6]Em virtude do Breve do Papa Clemente VIII, datado de 1597.

[7]As armas da família fundadora campeiam quer no exterior, quer no interior do convento.

Publicado no Jornal Beirão (60.ª edição)

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